domingo, 12 de dezembro de 2010

DIÁRIO DE BORDO

2 de abril de 1972



Estamos em Tumbes, na fronteira do Equador. Foi fácil pegar carona para chegar até aqui, e já estou adaptado aos meus novos companheiros de viagem. É interessante como às vezes mal se conhece alguém e parece que se está junto há anos. Pedro e Dedeco são tranqüilos, bem-humorados, seguros de si, enfrentam as dificuldades sem stress. Que diferença dos rapazes de Copacabana, sempre tensos, desconfiados, destemperados verbais. Não sei se não teria sido melhor termos continuado sem eles, em Salta, na Argentina. Naquela época nos virávamos bem, tínhamos um show ensaiado, éramos um grupo homogêno. Acabamos optando pela solução mais confortável – tínhamos passado alguns dias dormindo ao relento, e na última noite caiu uma chuva forte. Estávamos no meio do mato, à beira de um riacho, e tivemos que sair correndo. A possibilidade de viajar num ônibus equipado com camas e cozinha pareceu exclente naquele momento, mas logo começaram as complicações..

Pedro e Dedeco são duas pessoas totalmente diferentes um do outro. Pedro é poeta, introvertido, culto, formado em filosofia, enquanto Dedeco, fotógrafo e estudante de sociologia, tem uma enorme facilidade de comunicação, de abordar pessoas e resolver a questões do dia-a-dia. São amigos de infância e se entendem muito bem. Dedeco chama Pedro de Major. Até pensei que ele tinha sido do Exército, e perguntei isso a eles. Caíram na gargalhada. O cara fora excluído do serviço militar porque não fazia nada do que os superiores mandavam. Tem horror a trabalho, a esforço físico, a disciplina, a cumprir ordens. Temos conversado muito, e me parece que os dois estão gostando da minha companhia.
Alguns quilômetros antes de chegarmos a Tumbes a paisagem mudou completamente. De pé na caçamba da camionete em que viajávamos, vimos o verde nos envolver, depois de 45 dias no deserto. Começamos a dar gargalhadas, nos abraçamos e gritamos de felicidade. O verde, finalmente. Nascido e criado no Sul do Brasil, jamais pensei que um dia a visão de campos e florestas me comoveria tanto.


Nenhum comentário:

Postar um comentário