domingo, 12 de dezembro de 2010

A PLACE TO HIDE

Os moradores da casa têm uma coisa em comum: estavam em busca de um lugar lindo e tranqüilo para passar uns dias, semanas, meses ou a vida toda. E encontraram este refúgio em Otavalo, Equador, entre os vulcões Imbabura e Cotacachi. Com exceção de Phil, que estava dando um tempo depois de trazer algumas centenas de doses de LSD da Holanda para os Estados Unidos, os outros americanos deixaram o seu país para escapar da convocação para a guerra do Vietnã.

Todos tinham experiência de vida em comunidade. Compartilhavam o que tinham com naturalidade e as tarefas domésticas – limpar a casa, cozinhar, fazer compras – eram feitas sem atritos. Deixaram para trás suas faculdades e carreiras profissionais para viver modestamente, no limite da sobrevivência, com a ajuda dos pais e de amigos. Críticos do consumismo, da violência e do individualismo exacerbado da sociedade norte-americana, encontraram nesse pequeno país sul-americano um modo de vida parecido com o que gostariam de ter na sua pátria. Desfrutavam do que mais prezavam: liberdade, respeito, hospitalidade. Pequenos gestos, como o da dona da casa, uma senhora que morava no andar térreo, e às vezes nos surpreendia com um prato de pipoca quentinha, deixava-os emocionados. ''Isto nunca aconteceria lá'', comentavam, ''até porque volta e meia atrasamos o pagamento do aluguel.''

Conversávamos sobre tudo – a vida na Califórnia e no Brasil, os benefícios e os perigos de comer carne, as religiões, a política, a astrologia, música, viagens, sonhos. Nossa curiosidade insaciável abria portas para todos os temas. Cada um argumentava, explicava seus pontos de vista, respondia aos questionamentos com serenidade, sem gritaria ou bate-boca. Os visitantes contribuíam com suas experiências de vida, contavam coisas de seus países, e viajávamos, entre uma baforada e outra, pela Austrália, a Suécia, a França e várias regiões dos Estados Unidos. Traziam instrumentos musicais, aparelhos de som portáteis com fitas cassette. Eu cantava música brasileira, nós cantávamos juntos Beatles, Stones, The Mamas and the Papas, James Taylor, Carol King. Ouvíamos Pink Floyd, Jimmi Hendrix, The Band. Cada noite era uma celebração.

Na casa havia uma regra básica, não dita, mas cumprida, de nunca ceder ao baixo astral. Até no uso de drogas não se admitia barra pesada: um brasileiro de São Paulo apareceu numa tarde e depois de alguns minutos de conversa pegou uma seringa e uma ampola para injetar. Redwood, do alto de seus dois metros, disse para o rapaz fazer isso num canto da sala, e depois se retirar.

Quando hospedávamos casais, sempre cedíamos a eles um quarto, para terem privacidade.

Para quem vinha de um país submetido a uma ditadura militar, em que tudo era proibido, tudo era reprimido, conviver com pessoas desse nível foi como sair da escuridão para a luz. Um banho de civilização.



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